Hoje, vou falar das férias: é o tempo delas, como é tempo das cerejas. Outra árvore dá estes frutos, e a mesma árvore os arranca; os dias as trazem até nós, os dias as levam. Neste escoar se vai o tempo, mas enquanto as férias se aproximam tudo é desejá-las, fazer projectos, embalar ilusões. Chegado o dia, temos diante de nós um espaço vazio á espera, como uma grande sala que é preciso habitar. Que vamos lá por dentro? Os dias de férias ganham de repente um valor que os outros não tiveram. São dias totalmente disponíveis, á mercê da imaginação e das posses de cada qual. O tempo desligou-se da mecânica do relógio, é uma dimensão delimitada, informe, um pedaço de barro diante das mãos que o vão modelar.
As férias são também uma obra de criação. Não espanta, portanto, que no limiar delas um súbito temor nos intimide, aquele intervalo de tempo no qual a dúvida nos invade – que iremos fazer nós com o barro do tempo? Quando elas acabarem, umas lembranças desmaiadas como um sonho antigo é o que nos restará. Nada correu como imaginamos: choveu, veio uma dor de dentes, as paisagens não eram tão belas como as fotografias delas… Tudo isto são ilusões, o mundo está visto e decorado. Ninguém descobrirá a Europa, e a estátua grega, afinal, é uma pobre cópia romana… mas que importa? Este ano vou ter umas férias diferentes, iguais àquelas de infância em que descobri uma fonte nova que ninguém conhecia, se este ano não for, será pró ano. Porque a fonte lá estará…